Água doce: o pior problema atual

O primeiro ponto a esclarecer é óbvio. Não existe problema de falta de água. O problema é a falta de água utilizável, que, em geral, não pode ser a água do mar.
É muito caro tirar o sal da água. É um processo que consome muita energia. E a energia responde por cerca de 1/3 do custo total. O custo estimado varia entre 1 e 2 dólares por m3, por volta de 10 vezes o custo da água comum nos EUA. O descarte do sal residual é outro problema a ser enfrentado, já que o sal é um grande contaminante.
Apesar do custo, a dessalinização já é feita comercialmente em vários países, como Arábia Saudita, Estados Unidos, Espanha e Japão. No caso da Arábia Saudita, representa 70% do consumo de água potável. Nos EUA, apesar das exceções, a água dessalinizada responde por apenas 0,01% do consumo de água.
A pesquisa continua, mas a situação atual vigente ainda é a descrita acima. Há ainda potencial em acoplar a conversão ao uso de energia solar para, pelo menos, resolver o problema da fonte de energia.
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Estima-se que apenas 3% da água disponível são utilizáveis. Desses 2.5% estão sob a forma congelada, só restando 0,5% para consumo humano.
Onde estão esses 0,5% de água?
Um total de 10 milhões km3 estão em aquíferos subterrâneos, o que compreende praticamente 98% desses 0,5% da agua. Há alguma coisa que vem através da chuva, mas 77% dessa chuva cai nos oceanos. O resto da água doce está nos lagos, rios e em reservatórios.
Menos de 10 países contém 60% da água doce disponível do mundo. O Brasil é o país mais rico do mundo em água doce, em termos de vazão cúbica disponível anual, com 8.233 km3 estimados por ano, muito acima do segundo colocado, que é a Rússia.
Do uso mundial de água doce, a estimativa é que apenas 8% representa uso doméstico. 22% são para uso industrial e 70% são gastos na agricultura, mas há números divergentes, em outras fontes.
3 países sozinhos, pelo montante de sua atividade agrícola e industrial, respondem por cerca de 38% do consumo de água do mundo: China, Índia e EUA.
No caso da agricultura, cereais com uso intensivo de água como trigo, arroz e milho respondem por 27% do uso, produção de carne 22%, laticínios outros 7%.
Existe até alguma pesquisa para algas e plantas específicas, mas de maneira geral, a água salgada NÃO pode ser usada para agricultura. A força tarefa está mais no sentido de se tentar reduzir as necessidades de água para esse grande consumidor que é a agricultura. Há muitas iniciativas nesse sentido, mas há muita inércia também.
No caso da indústria, usa-se água para resfriamento (aço, energia), papel, químicos, cosméticos, etc.. O potencial de uso de agua salgada nesse setor, infelizmente, é baixo. Muitas soluções se baseiam na idéia de reaproveitamento da água, o que não vale, obviamente, para a indústria alimentícia. Há vários cases interessantes de sucesso na redução do uso da água. Por exemplo, a indústria de papel na Finlândia conseguiu reduzir o consumo de água em 90%. Uma nova tecnologia promete reduzir o consumo de água em processos resfriamento em 80%. No entanto, a maioria das iniciativas é ainda incipiente e tem um custo grande de instalação. Há muito o que se fazer, considerando o legado do parque industrial já instalado no mundo.
❖ O sistema hidrológico é ligado ao clima, e a mudança climática afetará bem a questão da água. O derretimento do gelo do alto das montanhas e dos glaciais, que abastecem aquíferos e rios na virada de estação, tende a se intensificar. Essa água tende a se incorporar aos oceanos.
Acredita-se que o Aquecimento Global intensifique os extremos climáticos, com mais enchentes em alguns lugares, e mais secas em outros. O problema é que as enxurradas representam um mau aproveitamento das águas pluviais. Além disso, em áreas urbanas o excesso de chuva pode trazer risco de contaminação de lençóis freáticos.
Outra questão é a possível contaminação de lençóis freáticos perto da costa pela água salgada, decorrente da constante elevação do nível médio dos oceanos. ❖
Não estamos perto de entrar em uma crise global da água. Já estamos nela. O relatório de Riscos Globais de 2015 do Fórum Mundial Econômico já considera a questão da água a ameaça de maior impacto para o planeta na próxima década e é a primeira vez que a água assume essa posição. Em 2017, passou para a terceira posição, logo atrás dos extremos climáticos (enchentes, tempestades, etc.) e armas de destruição em massa, sendo que esses outros riscos citados são muito difíceis de se gerir, na prática.
Aproximadamente 1/3 da população mundial vive em regiões com problema de água e cerca de 700 milhões de pessoas ainda vivem sem acesso à água potável segura. Reservatórios esgotados e leitos de rios secos são sintomas óbvios, mas boa parte desse quebra cabeça está invisível debaixo de nossos pés, como vimos acima.
O problema é que, em muitos lugares, o consumo de água a partir dos aquíferos subterrâneos é superior à sua taxa de reposição, o que leva a um progressivo esgotamento dessas reservas.
Quase todas as mais produtivas fazendas mundiais, incluindo o vale central da Califórnia, a planície do norte da China, o norte da Índia e as grandes planícies norte-americanas estão consumindo excessivamente esses ativos aquíferos.
Há 3 forças que pressionam o consumo de água para cima no futuro: crescimento vegetativo (adicional ao crescimento da população), crescimento populacional e urbanização.
No ritmo do crescimento projetado, O Banco Mundial prevê que produção de alimento global precisará crescer 50% até 2050, que é de onde se deriva o maior consumo de água.
Estima-se que em mais 15 anos, 2 bilhões de pessoas irão encarar severa escassez de água potável, praticamente triplicando o número atual.
A crise dos lençóis freáticos está afligindo muitas das megacidades mundiais. Houston, Jacarta e Cidade do México são alguns dos centros urbanos que estão bombeando tantos os lençóis freáticos que a terra por cima está desabando. Jacarta afundou 4 metros no curso de uma geração.
O pitoresco é que 2 regiões (São Paulo e Califórnia) que estão entre os países com maior fluxo de água doce do mundo (EUA e Brasil), estão passando por sérios problemas de água.
Fontes gerais
1) World Business Council for Sustainable Development – Water: Facts and Trends
2) Water.org - Facts About Water & Sanitation
3) WeForum.org - Why World Water Crisis are a top global Risk?
4) Treehugger.com - Agriculture Consumes 92% of Freshwater Used Globally
5) Racounter - Worldwide water crisis is looming
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Paulo Buchsbaum
É alguém muito conectado a todas as grandes questões da atualidade, navegando em áreas tão distantes como Economia, Exatas e Psicologia. Ele atua como consultor de negócios e empreendedor, mas tem paixão por escrever, já tendo 3 livros lançados. Seu site é www.negociossa.com